Munir Soares discutiu vantagens e desafios de implementar sistemas agroflorestais e a capacidade de geração de renda a longo prazo para comunidades e investidores
Munir Soares, CEO da Systemica, foi um dos convidados da oficina “Viabilidade econômica e financiamento de Sistemas Agroflorestais”, realizada em Altamira (PA) e com transmissão online pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Em sua fala, Munir falou sobre o objetivo da Systemica dentro desse cenário, e explicou a importância de falarmos sobre o mercado voluntário de carbono.
“A Systemica tem como objetivo transformar territórios, e nossa participação nesse evento tem a ver com o trabalho que temos iniciado em utilizar uma estratégia de recursos de conservação que possam auxiliar na transformação territorial. Nossa intenção foi apresentar uma proposta de um potencial de usar os recursos de REDD+ de um assentamento para que eles possam fomentar sistemas agroflorestais. O recurso que vai ser gerado pelo crédito de carbono florestal de conservação é revertido para a implantação de sistemas agroflorestais nos assentamentos, fortalecendo a agricultura familiar e acelerando o processo de regeneração dos territórios”, explica.
Durante o evento, Munir apresentou um estudo de caso a partir do assentamento de Pacajá, no Pará, com 4 áreas coletivas de interesse: Bom Jardim, Rio Arataú, Rio Cururu e Terra para a Paz. A proposta considera as metodologias REDD+ AUD e APD como possibilidade de geração de renda e fomento para desenvolvimento de SAF.
Desafio no mercado de carbono é aliar remoção de GEE existentes e redução de novas emissões
Um dos desafios hoje do mercado de carbono é o foco em comprar créditos de carbono de remoção, quando a floresta cresce e, com isso, gases do efeito estufa são absorvidos pelas árvores. A ideia, de acordo com Munir, é comprar em duas frentes: evitar emissões e remover os gases que já foram lançados na atmosfera. Para Munir, também “é importante evitarmos que a emissão exista, caso dos créditos de conservação, porque quando perdemos uma área de grande riqueza de biodiversidade, podem levar anos para que esse território se recupere. Muitas vezes, a recuperação acontece, mas a biodiversidade inicial é perdida”.
Uma das vantagens dos sistemas agroflorestais, além da preservação da biodiversidade local e regeneração da terra a longo prazo, é a capacidade desses sistemas de retirar carbono da atmosfera, contribuindo diretamente para a redução do efeito estufa. Os sistemas agroflorestais utilizam como modelo de cultivo os consórcios de vegetais, preservando as necessidades de cada espécie, protegendo o solo e oferecendo proteção natural contra pestes e invasores. A alta quantidade de matéria orgânica no solo fortalece o crescimento de raízes, sequestrando carbono da atmosfera e fixando-o no solo. O modelo da agrofloresta também melhora a qualidade do solo e da água, reduzindo a erosão e moderando o clima.
Projetos REDD+, responsáveis por subsidiar a conservação de áreas de florestas, já existem há um tempo considerável e possuem metodologias comprovadas e uma boa relação entre custo e efetividade. O custo de redução das emissões é muito mais barato, algo em torno de 10 a 15 dólares. Já um projeto com 100% de remoção, de acordo com Munir, custa entre 35 e 45 dólares, um custo maior e que demanda um investimento de maior comprometimento.
Créditos de carbono podem ajudar a cobrir parte dos altos custos de projetos SAF
“Os projetos de reflorestamento possuem muitos desafios, como mensuração, quanto de fato estou estocando nessa área específica. Também existe a complexidade de conciliar diferentes produtos para diferentes mercados. Todos os projetos que colocamos no mercado de remoção, caso de SAF, possuem liquidez imediata. Os preços são maiores. Temos muitas empresas interessadas, o problema é que muitas delas não possuem disposição de comprar o risco inicial e fazer esses aportes”, explica.
De acordo com a simulação mostrada na oficina, os valores de projetos SAF são altos, e demandam uma compreensão realista do que é possível fazer dentro dos territórios analisados. “Estamos falando de valores muito altos, de um bilhão, dois bilhões. Esses são os desafios de projetos de remoção, são projetos caros. Nosso pensamento é o seguinte: se pegarmos parte do recurso de conservação, que é facilmente gerado, quanto seria possível cobrir daquele potencial total. O que vemos é que, do potencial total, conseguimos cobrir algo em torno de 7 a 15% do recurso necessário para cobrir toda a área. O projeto de carbono não vai pagar a conta, mas ele pode ajudar na hora de gerar renda para comunidades, investidores e latifundiários comprometidos”, completa Munir.
Sobre o investimento a longo prazo em projetos de áreas coletivas, mensurados em no mínimo 30 anos, a Systemica passa os dois primeiros anos aperfeiçoando os processos de governança. Essa atenção é essencial para a longevidade dos investimentos e a possibilidade da autorregulação nas fases seguintes dos projetos. “No início, capacitamos as associações, articulamos com os atores locais, discutimos a repartição de benefícios, gestão de recursos, prestação de contas e vamos avançando. Passamos em média dois anos nesse reforço de governança, mapeando stakeholders locais e parceiros. Nós não entramos no projeto se não conseguimos criar essas condições. Temos riscos importantes em jogo, já que colocamos recursos antecipados nesses primeiros anos. Precisamos estar certos de que estamos criando algo bom para a comunidade e o ecossistema”, finaliza.
Assista aqui a oficina na íntegra: IPAM Amazônia – YouTube